Crônica vinculada no jornal Gazeta do Povo em 11 de julho de 1999.
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Um triste quadro nacional
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- Carlos Chagas -
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    Fazer o quê? Se aceitar a singular prorrogação aprovada no Congresso para beneficiar a instalação da Ford na Bahia, através de escandalosos benefícios e isenções, o presidente
Fernando Henrique estará perdido. Terá demonstrado que quem manda no Brasil é mesmo o ACM.
    Mas se vetar as facilidades, seguindo os conselhos do ministro da Fazenda, Pedro Malan, FHC também ficará numa sinuca de bico. Afinal, terá prejudicado a Bahia, tornando-se para ela o mesmo que Olívio Dutra foi para o Rio Grande. Além, é claro, de despertar as iras de Antônio Carlos Magalhães e arriscar perder o apoio do PFL no Congresso três anos e meio antes da conclusão de seu mandato.
    A situação está, para o chefe do governo, igual à daquele cidadão que, fugindo, o bicho pegaria, mas, ficando, o bicho comeria. A gente se pergunta como as coisas chegaram a esse estágio, e a resposta é simples: menos pela personalidade conciliadora do presidente, mais pelas armadilhas em que se deixou enredar, adotando o cruel modelo globalizante hoje em curso. Porque vantagens como as que o governo brasileiro deu à indústria automobilística internacional, nem de pai para filho. Faz tempo elas receberam isenção até de imposto de renda, como diminuição a níveis ridículos do imposto de importação e mais facilidades de
aquisição de terrenos, de circulação de mercadorias e de exportação.
    Um festival de subserviência para ninguém botar defeito, apenas para que os detentores do poder pudessem computar a instalação de mais uma fábrica. Ora bolas, proporcionalmente, a indústria automobilística cria menos emprego do que uma centena de outras atividades que nada exigiriam de benefícios. Que tal começar com a agricultura? Ou com a produção de álcool? O aproveitamento da biomassa? Até o turismo geraria mais riqueza e mais postos de
trabalho se contasse com os recursos colocados ao dispor das montadoras.
    Vivemos de modismos, ou, se quiserem, no reverso da medalha, de verdades absolutas. Basta um energúmeno qualquer proclamar que a História acabou, que depois da queda do Muro de Berlim só haverá um modelo, para uma parte de ingênuos acreditarem e outra parte de malandros se aproveitarem.
    Tome-se as privatizações, só para ficarmos num tema conhecido de todos. Primeiro, o governo brasileiro investiu montes de dinheiro nas empresas estatais, pretendendo torná-las atrativas para a privatização. Serviços públicos foram aprimorados, não obstante o desvio de recursos para atividades menos prementes do que a alimentação, a educação e a saúde. Ao mesmo tempo, tarifas foram aumentadas, para justificar os investimentos.
    Depois vieram as privatizações. A propaganda oficial encarregou-se de espalhar que o Brasil lucraria rios de dólares com as doações, perdão, as vendas, mas o que se viu foi bem diferente. A maioria dos que compraram empresas estatais brasileiras obteve franciscanos financiamentos do nosso próprio governo, através do BNDES. Nem se fala, hoje, das maracutaias de altos funcionários, até então ministros, para favorecer grupos de banqueiros amiguinhos.
    Nos contratos de privatização estabeleceram-se cláusulas pouco conhecidas, garantindo o aumento de tarifas e a remessa imediata de lucros declarados para o exterior. Da mesma forma como a transferência de departamentos das empresas privatizadas para o exterior, para criar empregos lá fora, cortando os daqui.  A primeira iniciativa dos compradores foi "enxugar" quadros, ou seja, demitir em massa, apesar da óbvia queda na qualidade dos serviços prestados. Esse é o clímax de tudo: quando postas à prova, as empresas privatizadas só demonstraram incompetência e má-fé. Os apagões verificados no Rio e no país inteiro, o caos no sistema telefônico, o anterior, verificado em São Paulo, e esse novo agora, que paralisou o país, como fica tudo isso?
    A resposta, infelizmente, é a mesma: as privatizações continuam sendo a salvação nacional. Só se for para salvar bancos fajutos, comissões vultosas e interesses execráveis...
 


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