Jornal Gazeta do Povo, 23 de Janeiro de 2000.
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Irresponsabilidade
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- Antônio Ermírio de Moraes -
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O autor analisa o projeto da lei de responsabilidade fiscal e alerta
para a suspeita reação de muitos políticos ao projeto.

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    Há pouco tempo, um ministro da Economia da França renunciou pelo simples fato de terem levantado contra ele uma suspeita de malversação de recursos públicos. O ex-chanceler da Alemanha Helmut Kohl acaba de sair do seu partido, acompanhado pelo suicídio do tesoureiro, devido a acusações de recebimento de recursos para as campanhas da União Democrata Cristã. No Japão, volta e meia um governante se afasta da política - e até da vida! - quando se insinua um mau uso do dinheiro do povo.
    No Brasil, não se pede demissão nem de cargo de síndico de condomínio... Para a maioria dos políticos, poder não se abandona, se perde - por eleição ou demissão.
    Pois bem. Tramita no Congresso Nacional um conjunto de medidas que visa a estabelecer um mínimo de disciplina para quem ocupa cargo público - o projeto de lei da responsabilidade fiscal. Só agora, depois de 18 meses, a Câmara dos Deputados resolveu colocá-lo em regime de urgência. E, mesmo assim, está difícil de aprovar. Por que tanta resistência? O que há de revolucionário naquela peça?
    Nada. O projeto visa simplesmente a colocar os governantes dentro de regras de ética e de racionalidade:

    1) A nova lei estabelecerá que nenhum governante poderá assumir dívidas que o governo não possa pagar. O que há de errado nisso?

    2) Ela exigirá que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário gastem com pessoal no máximo 60% do seu Orçamento nos âmbitos estadual e municipal e 50% no âmbito da União. Qual é o problema de incluir os três Poderes numa norma tão elementar como essa?

    3) O novo instituto legal demandará que os governantes prestem contas à população - e não apenas aos tribunais de contas - sobre o que fizeram com o dinheiro público, comprovando, por exemplo, o
quanto reduziram a mortalidade infantil, a repetência escolar e a criminalidade. Em que isso atrapalha a vida do político-estadista?

    O que deve estar atrapalhando os governantes renitentes é a perspectiva de ter de passar de um ambiente de liberalidade anárquica para um estado de liberdade democrática. Muitos políticos enxergam "problemas graves" para suas carreiras, tais como os empecilhos que a nova lei imporá aos atuais prefeitos e vereadores para abrirem os cofres públicos na hora das campanhas para sua reeleição.
    O Brasil precisa dar um basta ao festival de gastança e irresponsabilidade que ainda impera numa grande parcela da política brasileira. Está aí uma grande oportunidade para os membros do Congresso Nacional mostrarem que estão realmente a fim de cuidar do dinheiro duramente pago pelo contribuinte ao poder público.
    Por isso, caro leitor, fique de olho. Observe quem está resistindo, identifique seus correligionários e fuja de todos eles na hora de votar. O voto é a única arma da qual você dispõe no regime democrático. Use-a, portanto.


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