O que é Democracia?
Estamos vivenciando um regime democrático no Brasil?
Uma das coisas mais curiosas é o tal do "óbvio".
Ao que parece, desde que a coisa se enquadre
nesta definição, torna-se um caso superado
e não se fala mais nisto.
Convoco todos para nos aproximarmos
um pouco mais de tal peculiar figura
e observarmos o quanto o temos desprezado.
Partindo do princípio que as coisas simples
é que são belas, compreensíveis e factíveis,
apresento como barro para a olaria,
minha visão do tema, na esperança de que possamos
juntos modelá-lo.
Um cascalho sem brilho, para lapidarmos.
Considero estes conceitos como os mais importantes
para nos permitir sonhar juntos um ideal,
por mais utópico que seja.
Quem sabe conseguiremos aparar nossas arestas,
comungando então de um propósito comum?
Comparo os conceitos fundamentais da Democracia
com nossa realidade tupiniquim:
1. Todo poder emana do povo e em seu nome é exercido
O simples fato de haver eleições,
não implica fatalmente em que haja uma Democracia.
É fundamental examinarmos a qualidade
do livre exercício do direito do voto.
O poder no Brasil (e na quase totalidade do planeta)
emana do investimento feito
pela burguesia/plutocracia (*) no processo eleitoral,
assegurando a esta minoria
a multiplicação do valor de seus votos,
através de um número de políticos mercenários,
suficiente para dominar sobre o proletariado,
em nome da qual o poder é, de fato, exercido.
Basta perguntar às pessoas simples que conhecemos
se elas se sentem emanando poder de tal forma
que o Estado o exerça em seu nome.
Tudo isto infringindo a própria Constituição, que reza:
Capítulo IV - Dos Direitos Políticos
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio
universal e pelo
voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei,
mediante:
§ 9º - Lei complementar estabelecera' outros casos de inelegibilidade
e
os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade
administrativa,
a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa
do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições
contra a
influencia do poder econômico ou o abuso do exercício de função,
cargo ou emprego na administração direta ou indireta...
Desta forma, somente teremos eleições verdadeiramente livres
e legítimas quando for vetada à elite o direito de financiar
a campanha de candidatos, coisa impossível à classe operária,
fazendo assim, com que ambas sejam iguais perante à lei.
2. Todos são iguais perante a lei.
No Brasil (idem) somente os ricos são iguais perante a lei,
tendo sua fortuna para financiar políticos,
pagar advogados, usufruir de inúmeras instâncias
para recorrer das decisões anteriores dos juizes,
bem como para propinas que
visem adiantar ou retardar o andamento do processo,
conforme seja o seu interesse.
"Cadeia é somente para preto, pobre e prostituta"
se tornou provérbio na sabedoria popular.
Estes dois são os aspectos absolutos
para que se germine uma Democracia.
Sem eles, teremos apenas as mais variadas colorações
de despotismo, opressão e demagogia.
Os que abaixo se seguem seriam,
nada mais, nada menos,
que uma conseqüência natural dos primeiros.
Ou, não teriam sentido, caso existissem sem aqueles.
3. Há liberdade de expressão do pensamento.
Ao nível individual isto ocorre, mas a mídia
é altamente influenciada por sua dependência de
propaganda (e financiamento) governamental e
das empresas particulares,
motivo pelo qual procura agradar prioritariamente
a estes seus clientes/patrões,
e, concomitantemente, atrair aos telespectadores,
ouvintes e leitores para as quinquilharias anunciadas.
4. Há liberdade de locomoção (direito de ir e vir).
Nada percebo que limite esta condição por aqui,
com conotações eminentemente políticas.
No entanto, os deficientes físicos necessitam
que os consideremos, ao projetarmos vias
e edifícios públicos, bem como residências particulares.
O pagamento do elevado valor dos pedágios
em rodovias privatizadas tem também contribuído
para restringir esta condição,
já sofrível pela baixa qualidade das pistas de tráfego.
5. Há liberdade para agremiação politíco-partidária.
Também não temos problemas nesta área.
Bem, a não ser pelo fato de que,
quem detém o podre poder econômico,
dispõe de condições altamente superiores
à da classe que exploram, para se organizar politicamente
e perpetuar a dominação sobre ela.
6. Ninguém é preso arbitrariamente ou condenado
sem o livre direito de defesa.
Há um número preocupante de distorções,
como prisões por engano,
e manutenção do condenado por mais
tempo que estipulado na pena.
As condições das penitenciárias ferem
abundantemente as normas mínimas
de higiene, conforto, segurança e a
possibilidade de reeducação do infrator da lei.
Os ricos tem direito (desde que paguem por isso
aos funcionários públicos responsáveis pelos
estabelecimentos carcerários ou delegacias)
a tratamento cinco estrelas, enquanto os
pobres são amontoados como sardinhas
em celas fedorentas e abafadas.
7. Ninguém é torturado ou assassinado pelo Estado.
É comum a tortura nas cadeias,
delegacias e penitenciárias,
bem como somos um dos países
em que o Estado mais mata.
Contudo, desconhecemos que tais expedientes
sejam aplicados democraticamente,
incluindo também a classe dominante em seus alvos.
http://www.epoca.com.br/nd/br240699.htm
>>> Relatório aponta prática sistemática
de tortura nas prisões brasileiras.
A Anistia Internacional divulgou dia
23/06/99, em São Paulo, um relatório
de 79 páginas sobre a violação de
direitos humanos contra detentos nas
penitenciárias brasileiras.
O documento critica a superlotação e a
falta de assistência médica e judiciária
aos presos. Aponta também a prática
sistemática de tortura institucionalizada
em prisões e delegacias. <<<
8. Justa distribuição da riqueza nacional.
Somos um dos países mais atrasados do mundo
nesta área, onde continua gradativamente
a concentração nas mãos de uma minoria.
Se houvesse realmente democracia,
seria realizada a vontade do povo:
trabalho, educação, saúde, lazer e
planejamento familiar (gerando somente
aqueles que a sociedade tem condições
de transformar em cidadãos),
uma utopia para a maioria dos brasileiros.
CONCLUSÃO
Mesmo estando em um Estado Democrático de Direito,
estamos há outros 500 anos de distância
de um Estado Democrático DE FATO.
Estamos em uma Ditadura Civil Plutocrática, a qual,
nada mais é que a Ditadura Militar Plutocrática
travestida e maquiada sob alguns poucos
e irrelevantes aspectos democráticos.
O fundamental, que é o governo
do povo,
para o povo e
pelo povo,
fica sempre maquiavelicamente negligenciado.
Saímos do domínio do poder das baionetas
e permanecemos ainda debaixo
do poder econômico que o patrocinou.
O pior de tudo é que, mesmo a apopléxica esquerda
brasileira ainda não descobriu isto.
A começar pela forma autocrática como dirige
seus partidos.
E, ainda por cima, chama carinhosamente
a Ditadura Civil Plutocrática de Neo-Liberalismo,
Democracia Impopular, Democracia Burguesa,
Democracia Elitista, etc.
(*) "Plutocracia: Sociologia. Dominação
da classe capitalista,
detentora dos meios de produção, circulação
e distribuição de riquezas,
sobre a massa proletária, mediante um sistema político e
jurídico,
que assegura àquela classe, o controle social e econômico."
(Aurélio Buarque de Holanda, Dicionário)