Fonte: A PULGA, neoliberalismo e liberalismo.
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Como os EUA assumiram o poder no Brasil
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- Gregory Palast -
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Tradução: Bernardo Rieux (de A Pulga).

7 de Março de 1999.


    Eleitores escolheram o Presidente Cardoso, mas esquemas americanos
'empossaram' Robert Rubin, Secretário do Tesouro dos EUA.

    Quando o Secretário do Tesouro Nacional dos Estados Unidos Robert Rubin era criança sonhava em ser Presidente - do Brasil. Agora o seu sonho realizou-se. É claro, como um americano vivendo em Washington, Rubin subiu ao poder da única maneira que pode - através de uma 'fraude' brihante.
    O Presidente nominal do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, foi re-eleito em outubro passado por apenas uma razão: ele tinha aparentemente estabilizado a moeda do país - e 'consequentemente parou' a inflação.
    Em verdade, ele não o fez. o Real brasileiro foi ridículamente sobrevalorizado. No entanto, com a aproximação das eleições, a taxa de conversão em relação ao dólar 'desafiou e gravidade'. Este milagre 'carregou' Cardoso para a vitória, com 54% dos votos. Mas milagres não acontecem na realidade. 15 dias depois da posse de Cardoso, o Real 'perdeu o equilíbrio' e 'caiu.
    Hoje, o câmbio é 'aproximadamente' a metade do valor praticado no dia das eleições. A inflação 'disparou' e a economia 'implode'. O apoio a Cardoso, agora 'acusado' como um incompetente trapaceiro, caiu para 23% do eleitorado. É tarde. Ele agora já é o Presidente.
    Bem, mais ou menos. Não resta muito à presidência de Cardoso, a não ser o título. Todas as políticas de 'impacto', dos gastos aos empregos, são ditadas pelo FMI e seus "brethren agencies" (não sei o que é isto...). E por trás de tudo, 'no comando', está o Secretário do Tesouro Rubin, quem dita as regras como presidente de fato do Brasil sem perder sequer um simples cocktail party nos Estados Unidos.
 
    Este é o preço que Cardoso paga pelos serviços prestados por Rubin na campanha eleitoral. Foi o Tesouro Americano que, com o FMI, elevou a cotação da moeda brasileira. Rubin tinha boas razões, além de Cardoso, para manter a cunhagem duvidosa de Real no Brasil. Sabendo que a moeda iria em pedaços depois das eleições, o Tesouro Americano assegurou-se que os seus bancos pudessem tirar o seu dinheiro para fora do país em termos favoráveis.
    Entre Julho último e a posse em Janeiro, as reservas em dólar do Brasil caíram de USD 70 bilhões para USD 26 bilhões , um sinal de que os banqueiros 'cavaram' o seu dinheiro e correram. (tenho dúvidas na tradução, pois 'billion' no original de Londres é trilhão (1.000.000.000.000) na Inglaterra e bilhão (1.000.000.000) nos E.U.A....)
    Mesmo assim a moeda manteve-se alta antes das eleições porque os Estados Unidos afirmou que iria repôr as reservas com um pacote de empréstimos do FMI. E fez-se bastante claro para os eleitores que os fundos seriam negociados apenas com Cardoso, não com a oposição, o Partido dos Trabalhadores.
    O apoio da elite internacional foi selado aparentemente no Rio de Janeiro, Julho último, com Peter Mandelson, 'cujo incomum aval' a Cardoso marcou oficialmente o envolvimento de Cardoso no projeto "terceira via" Clinton-Blair e causou sensação na imprensa brasileira.
    Um mês depois da re-eleição de Cardoso, no devido tempo, o FMI ofereceu créditos no total de USD 41 bilhões. "Brazil will net none of it, of course". Qualquer dinheiro que atualmente chegue ao país embarca no primeiro avião de volta para fora, junto com os investidores e especuladores, abandonando o país.
    Os brasileiros são deixados para pagar a conta. Mas este é o último dos seus problemas. Como parte na 'magia negra' de manter as taxas de câmbio na pré-eleição, Washington pressionou o Banco do Brasil para aumentar suas taxas, que estão agora em 39%. O FMI queria 70%. Nas ruas de São Paulo, isto se
traduz em taxas de juros acima de 200% nos empréstimos pessoais e créditos a empresas.
 
    A confirmação do esquema de Rubin para 'livrar a cara' de Cardoso e dos bancos americanos me veio de uma fonte muito interessante: Jeffrey Sachs, da Universidade de Harward. Sachs é melhor lembrado como o Typhoid Mary (possível alusão à epidemia de tifo...) do neo-liberalismo, que espalhou teoremas sobre livre-mercado e depressão econômica de um lado a outro da antiga União Soviética. Sachs, que ainda é 'ouvido' no círculo dos jogadores do jogo financeiro internacional, falou-me: "Você pode ver a economia (do Brasil) indo para o abismo. Acontece em câmara lenta. Mas, ao invés de prevenir o colapso através da desvalorização controlada, Washington e o FMI encorajam vigorosamente um aumento de 50% nas taxas de juros."
    "Washington queria a re-eleição de Cardoso." - ele disse-" E os financeiros americanos precisavam de seis meses para 'descontar' os títulos e moeda brasileiros em termos favoráveis".
 
    Se o golpe de estado financeiro de Rubin mostra-se bem praticado, isto é porque ele usou o mesmo método em 1994 para se tornar o Presidente 'de facto' do México. Uma vez mais, um 'dirigente desconfiado' retornou ao poder no 'fortalecer a sua moeda' e nas 'promessas de apoio dos Estados Unidos'.
    Quatro semanas depois da posse do Presidente Ernesto Zedillo, o 'peso' caiu enquanto os 'prestamistas' americanos no México 'livraram a cara' através de fundos de empréstimos especiais dos Estados Unidos.
 
    Cardoso sabe demais para não colocar a culpa pelos problemas do Brasil nas manipulações de Rubin. Melhor, com ajuda da imprensa de direita, ele e o FMI depositam as culpas do colapso econômico nos mesmos e familiares vilões, velhos conhecidos dos leitores britânicos: servidores públicos, pensionistas e sindicatos. Eles são acusados de 'queimar' o orçamento do governo.
    Isto é loucura. Pagamento de juros, salienta Sachs, são iguais a monstruosos 10% dos gastos do país, e contabilizam para a duplicação do déficit federal. Comparado com isto, as pensões pagas pelo governo para os trabalhadores, alvo chefe dos 'cortadores de orçamento', são gotas no oceano.
    Mas a análise de Sachs passa perto. Ele afirma que o FMI 'falhou', porque os altos juros acarretam crise e depressão. Ele está enganado. Crise é parte do plano.
    Apenas no cenário de pânico econômico o FMI e Rubin podem libertar "os Quatro Cavaleiros da Reforma": matar despesas sociais, cortar a folha de pagamento do governo, quebrar os sindicatos e, o  prêmio principal, privatizar lucrativas empresas públicas.
 
    Entretanto Cardoso não está contente em ser um marionete nas mãos de Rubin. Formalmente um sociologista e experto em teorias de dependência, ele tem que sofrer a perda da soberania financeira do Brasil.
    Ele sobreviveu às eleições, mas a oposição levou do seu partido os maiores Estados da União. Os novos governadores regionais não estão 'pesarosos'. Eles estão mostrando os seus dentes.
    Em Janeiro, o antigo presidente do Brasil, Itamar Franco, assim que foi empossado como Governador do estado de Minas Gerais, recusou o pagamento de dívidas do tesouro federal. Seis outros governadores, então, falaram a Cardoso o que qualquer pessoa sensata falaria a um 'tubarão dos empréstimos', que aumentasse suas taxas de juros de 10% para 60%: vá para o inferno.
    A imprensa taxou Franco como um palhaço, e com ciúmes em relação a Cardoso. Seu propósito é desviar a atenção da verdadeira ameaça a Cardoso e ao FMI, Olívio Dutra, o popular governador do estado do Rio Grande do Sul e estrela em ascendência do Partido dos Trabalhadores. Filho de agricultores sem terra, sua juventude, militância 'suave' para a era da TV, transformou a capital do estado num 'modelo' de  desenvolvimento a nível nacional.
 
    É Franco que eles atacam, mas é Dutra que eles temem. Cardoso está fazendo o possível para punir os cidadãos do Rio Grande do Sul pela eleição de Dutra, que não cancelou os pagamentos ao governo federal, mas pagou as dívidas, em torno de 27 milhões (libras), em tribunal.
    Cardoso respondeu violentamente, retendo 37 milhões (libras) em impostos coletados pelo Rio Grande do Sul. O FMI bloqueou os empréstimos para o Rio Grande do Sul.
    Contactado por telefone em seu gabinete em Porto Alegre, Dutra disse que ele aceita que a crise implique em sacrifícios. Ele já despediu funcionários do estado. Mas ele também teve a audácia de sugerir que a General Motors e a Ford juntem-se a estes sacrifícios e desistam do bloqueio aos impostos que agora sangram o tesouro do estado.
    O Brasil é uma nação rica. Seu produto interno bruto, mesmo em depressão, é um terço de trilhão de libras ('trillion' no original inglês e, possívelmente, é melhor traduzido para quartilhão...). Mas como um frenético hamster numa roda de brinquedo, está perdendo a corrida para capturar o seu próprio capital livre, que é comprado de volta a taxas de juros abusivas.
    Por isto é que Dutra está sendo especialmente pressionado e atacado para privatizar o banco de desenvolvimento do seu estado, um propulsor do auto-financiamento da expansão do estado. O governador, que não é tolo, não desperdiça balas na humilhação de Cardoso. Para organizar a resistência às exigências de Rubin e dos termos do empréstimo do FMI, Dutra astutamente aponta não ao marionete, mas sim ao 'manipulador'.


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